Média nacional teve recuo de -9,1%; São Paulo, que acumula um terço de toda a produção do país, foi o estado que mais puxou essa média para baixo
Pela
primeira vez em quase dez anos, a produção industrial registrou queda
em todos os locais pesquisados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE). A média de recuo do Brasil na atividade industrial
ficou em 9,1% na passagem de fevereiro para março deste ano. A
justificativa foi o isolamento social causado pelo novo coronavírus, que
afetou diretamente a produção nacional.
O último resultado nesses moldes foi
registrado em 2012 e um semelhante foi noticiado em 2018, com a greve
dos caminhoneiros daquele ano, derrubando a produção de 14 dos 15 locais
pesquisados. Dos 15 estados ouvidos agora pela Pesquisa Industrial
Mensal Regional, divulgada na última semana (14), Ceará, Rio Grande do
Sul e Santa Catarina obtiveram os piores resultados em valores
absolutos, variando entre 21,8% e 17,9% negativos.
“É a primeira vez, desde o início da
série histórica, em formato com 15 locais, que isso acontece. Em termos
regionais, nós observamos nessa passagem de fevereiro para março que o
impacto do isolamento social causado pela covid-19 é direto sobre a
produção industrial”, explica o analista da pesquisa Bernardo Almeida.
No formato antigo, segundo ele, com 14 locais, a última queda
generalizada foi registrada em 2008, por consequência da crise
financeira global.
O estado de São Paulo também sofreu uma
queda significativa. Por concentrar mais de um terço da indústria
nacional (34%), o estado foi o local que mais influenciou nesse
resultado negativo, com -5,4%. Duas atividades contribuíram fortemente
para essa queda: veículos e bebidas. “É a taxa mais intensa desde maio
de 2018, quando atingiu -12,4%”, lembra Bernardo Almeida.
Os dois estados do Sul que compõem o
ranking de maior queda na passagem de fevereiro para março contribuíram
para diminuir a média nacional. Rio Grande do Sul teve queda de 20,1% e
Santa Catarina teve -17,9%.
Pará (-12,8%), Amazonas (-11%) e a
região Nordeste (-9,3%) apresentaram resultados negativos maiores do que
a média nacional. Em contrapartida, Pernambuco (-7,2%), Espírito Santo
(-6,2%), Bahia (-5,0%), Paraná (-4,9%), Mato Grosso (-4,1%), Goiás
(-2,8%), Rio de Janeiro (-1,3%) e Minas Gerais (-1,2%) tiveram índices
negativos abaixo da média do país.
Para o economista do Instituto
Brasileiro de Mercados de Capitais (IBMEC) William Baghdassarian, essa
queda pode ser explicada sob várias óticas. “Do ponto de vista
doméstico, houve queda na demanda. Como as pessoas não estão
trabalhando, paradas ou com medo, a demanda cai”, avalia.
Outro fator citado pelo economista é a
impossibilidade de atuação de alguns setores, já que algumas cidades
proibiram atividades específicas – característica do lockdown, quando há
isolamento total das atividades. “Do ponto de vista local, essa queda é
explicada pela combinação da baixa demanda e da baixa oferta. Além
disso, a gente vê também uma incerteza política grande e isso se não
afeta a produção no curto prazo, afeta no médio prazo.”
Foi o que aconteceu com as indústrias no
Ceará. O assessor econômico da Federação das Indústrias do Estado do
Ceará (FIEC), Lauro Chaves Neto, reforça que o estado decretou
paralisação total das atividades da indústria nesse período de pandemia,
com exceção dos setores alimentícios e da prestação de serviços
relacionados à saúde. “Como a partir de maio tivemos um lockdown, já é
esperado um cenário com uma queda ainda maior das atividades em relação a
abril e uma estabilidade no mês de maio”, projeta.
Lauro acredita que a recuperação virá
após o fim das medidas de isolamento social, ainda sem previsão. “Esse
ritmo de abertura vai depender muito de estado para estado e se dará de
forma muito lenta. O esperado é que a atividade industrial inicie seu
processo de recuperação no início de 2021. É um cenário muito drástico e
vamos precisar de uma coordenação muito grande de uma política
econômica com os movimentos políticos, para que o Brasil consiga sair
dessa recessão criando bases para um crescimento industrial futuro”,
defende.
Comparação
Em comparação a março do ano passado, a indústria teve queda de 3,8%,
com 11 dos 15 locais ouvidos com resultados negativos. O resultado
também é consequência da pandemia do novo coronavírus, segundo o
economista do IBMEC William Baghdassarian. Ele observa que o fechamento
das atividades por causa do isolamento social não atinge o mundo na
mesma escala. “Ele começou na China, foi para a Europa e agora chegou na
América”, recorda.
São Paulo, mais uma vez, influenciou
nesse forte tombo da produção no período. De acordo com a pesquisa, o
estado registrou 4,2% negativos, com recuo em 14 das 18 atividades. O
setor automotivo novamente puxou os números para baixo, além do setor de
transportes e produção de avião. Também contribuíram para o resultado
negativo os estados de Santa Catarina (-15,6%), Espírito Santo (-14,2%),
Rio Grande do Sul (-13,7%) e Ceará (-10,5%).
Do ponto de vista macroeconômico,
Baghdassarian reforça sobre as cadeias internacionais de produção. “Hoje
em dia, as fábricas utilizam muitos insumos vindos de fora. Para você
fazer um veículo no Rio Grande do Sul, por exemplo, você precisa de
insumos que vêm da China, do Japão, da Coreia. Se essas cadeias de
produção de suprimento não estão ‘azeitadas’ e as coisas não estão
chegando na hora que têm que chegar, você para a produção.”
Já Rio de Janeiro (9,4%) e Bahia (5,8%)
avançaram no comparativo a março de 2019. O Rio mostrou alta em dez das
14 atividades pesquisadas. A Bahia teve impacto maior nas atividades de
coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis, além da taxa
positiva de produtos alimentícios. Para fechar a lista dos quatro
estados com resultados positivos no comparativo entre março dos dois
anos, entram Paraná (1,6%) e Pernambuco (1,4%).
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