Dados da ONU mostram que nove em cada 10 pessoas têm preconceito de gênero; no país, 24 milhões de mulheres tem próprio negócio, segundo Sebrae
De
todos os países do mundo, o Brasil é o ambiente onde as mulheres mais
sofrem preconceito. Por conta do gênero, mulheres são apontadas como
menos capazes de exercer lideranças políticas, de assumir cargos em
diretorias de empresas e de serem chefe de negócios. Mas quando elas
decidem provar para o mundo que ele está errado, o resultado pode ser
fantástico.
E uma das formas delas “meterem o pé na porta” é por meio do
empreendedorismo. Mulheres de fibra que ajudam a colocar esse mesmo
Brasil preconceituoso em um outro ranking, agora mais próspero, o de 7º
país em maior proporção de mulheres empreendedoras.
Começar o negócio pode vir de uma necessidade, do susto ao ficar
desempregada, após o fim de um relacionamento e até como atividade
complementar a um outro serviço para evitar riscos financeiros. O
consenso é que em nenhum dos casos é fácil. É o caso de Marina Queiroga
Carneiro, de 29 anos. Proprietária de uma agência de publicidade de
Brasília, a jovem superou mais do que os obstáculos tradicionais de
empreender no Brasil, como o pagamento de impostos e a burocracia para a
abertura de empresas.
“Quando chego na reunião, com cara de jovem e por ser mulher, tive
que provar muito mais para os meus clientes. Trazer muito mais
resultado, muito mais rápido, porque eles já me julgavam menos capaz do
que se fosse um homem”, conta.
O primeiro “negócio” de Marina foi antes mesmo de chegar a
maioridade. Ao ver que precisaria parar com as aulas de balé porque a
mãe não podia mais pagar o curso, começou a dar aula para meninas mais
novas para pagar sozinha as aulas. As ideias foram mudando, os
obstáculos foram crescendo, mas o propósito se manteve. Hoje, Marina
gerencia uma agência de publicidade e emprega outras quatro mulheres.
“Eu falaria para elas não se intimidarem e fazerem o que querem fazer
para serem felizes e não para agradar a alguém. Porque vejo muito essa
sensação de agrado, compensação, como se tivessem que se provar para o
mundo, mas tem que ser para nós mesmas. E a partir daí começa a se
reconhecer e, consequentemente, terá um reconhecimento da sociedade.
Isso é o principal”, aconselha.
A sensação de intimidação a que Marina se refere se justifica. O
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) analisou 75
países, que representam 80% da população global, e concluiu que nove em
cada dez pessoas, inclusive mulheres, têm preconceito de gênero. Segundo
a pesquisa, o consenso é que mulheres são menos capazes apenas pelo
fato de serem mulheres.
Não na mesma proporção, mas engajadas em transformar essa realidade,
as empreendedoras somam 24 milhões de pessoas, segundo dados do Sebrae.
Uma delas é Kelly Nogueira, de 40 anos. De policial militar no estado de
São Paulo a empresária de sucesso. O gatilho para a mudança de vida foi
um relacionamento abusivo.
“Meu ex-namorado era abusivo, me menosprezava, dizia que eu não seria
ninguém, dizia que tinha nojo de mim porque minhas unhas eram roídas.
Muito tempo sofri em silêncio, até que alguma coisa despertou em mim e
decidi que estava na hora de mudar minha vida. Peguei o que mais me
machucava e transformei na minha força”, lembra. Assim surgiu o primeiro
quiosque de alongamento de unhas. Depois veio uma loja, que hoje faz
parte de uma rede de sete. Cada uma fatura cerca de R$ 1 milhão por ano.
“A minha história de vida inspira muitas mulheres. Não tenho só o
serviço de unha, eu empodero, vendo autoestima e transformação”,
ressalta Kelly.
Para Juliana Guimarães, especializada em Concepção e Gestão de
Negócios, o empreendedorismo surge muitas vezes como uma forma da mulher
se relacionar com o mundo. “Vejo que quando as mulheres buscam essa
alternativa, buscam não só para complementar a renda, mas para suprir
uma necessidade de autorrealização. Para fazer aquilo que realmente
gostariam como atividade principal”, pondera.
Ao fazer esse “enfrentamento”, segundo Juliana, é preciso ampliar o
debate para reverberar. “A gente precisa entender que não adianta
discutir apenas entre nós o quão é importante a nossa representatividade
dentro do mercado. Tem que trazer os homens para que eles entendam.
Porque a gente vem de um processo de criação de cultura muito machista,
que teve mudanças, mas que precisa continuar. É importante ter
diversidade, inclusive, no âmbito de quem discute o assunto para poder
mudar a situação”, indica.
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