Resolução da Anvisa que permitia a aplicação por farmacêuticos era questionada na justiça. Para juiz, contexto de pandemia justifica a nova atribuição dos profissionais
Uma
decisão da Justiça definiu que testes rápidos para detectar a Covid-19
podem ser aplicados em farmácias. Essa possibilidade já existia desde o
final do mês passado, quando a Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa) publicou uma resolução permitindo que farmacêuticos apliquem os
testes que detectam os anticorpos produzidos pelo corpo para combater o
novo coronavírus, indicando assim que a pessoa está infectada. O texto
diz que a medida foi tomada por conta da emergência na saúde pública e
que é uma decisão de caráter temporário e excepcional. Por isso, a
resolução tem validade até que acabe a situação de emergência no Brasil
por conta da pandemia.
“É uma iniciativa importante para
ampliar o acesso aos exames, reduzindo custos e evitar aglomerações, bem
como diminuir a procura pelo serviço médico em estabelecimento da rede
pública, que está sendo altamente demandada ao longo dessa pandemia”,
avalia o presidente do Conselho Federal de Farmácia, Walter da Silva
Jorge João.
A dúvida surgiu quando um
microempresário entrou com um pedido de mandado de segurança contra a
Anvisa, em uma tentativa de derrubar a resolução. O argumento é que a
legislação atual não prevê que esses profissionais possam fazer análises
clínicas. Segundo ele, as leis e decretos existentes designam essa
atividade para biomédicos, farmacêuticos bioquímicos e médicos. Ou seja,
para ele, antes do farmacêutico poder aplicar o teste, ele precisaria
da especialização em bioquímica. Ele também argumenta que se fosse
permitida a aplicação em farmácias, o teste acabaria sendo feito pelos
balconistas das lojas, em vez dos farmacêuticos, como exige a resolução.
Mas a 5ª Vara Federal Cível da Seção
Judiciária do Distrito Federal (SJDF) determinou o arquivamento da ação.
Para o Juiz Federal Cristiano Miranda de Santana, a resolução é válida,
justamente pelo contexto da pandemia global, que exige medidas
emergenciais para diminuir o número de mortes. Ele destacou que o
interesse na “preservação da saúde pública” se sobrepõe ao “interesse de
classes que querem reservar esse procedimento a um nicho profissional”.
Para o Conselho Federal de Farmácia, a
decisão do juiz foi acertada. “Se existem coletas sendo feitas em
drive-thru pelos próprios órgãos públicos de saúde é perfeitamente
razoável que esses testes rápidos também sejam realizados nas farmácias
pelo farmacêutico, que é um profissional da saúde plenamente
habilitado”, destaca o presidente do conselho, Walter da Silva.
O advogado Renato Araújo explica que
nesse caso, a análise da justiça não leva em conta somente as
legislações que definem o papel de cada profissão. “Eu compreendo que em
um estado de emergência, como estamos enfrentando nessa pandemia, é
essencial que o direito e as teorias jurídicas criem exceções, não
positivadas nas regras comuns. Essa foi uma decisão acertada, já que
estipulou várias precauções: a farmácia deve possuir licença sanitária,
atender a boas práticas, garantir a biossegurança do procedimento e
somente o farmacêutico pode realizar o teste rápido”, explica.
Recepção dos estados
Desde que a liberação da aplicação de
testes em farmácias foi anunciada, governos estaduais viram a medida com
uma forma de diminuir a pressão sobre o sistema público de saúde. Como a
resolução da Anvisa estabelece que os resultados dos testes sejam
enviados ao governo, a testagem pode ajudar as administrações a terem
acesso a um número de infectados mais próximo da realidade. Em coletiva
de imprensa na semana passada, o secretário de saúde do estado São
Paulo, José Henrique Germann Ferreira, comemorou a decisão. “Nós estamos
elaborando nosso plano de testagem, que se considera o uso de testes
rápidos. O fato da Anvisa ter liberado para utilização em farmácias
obviamente capilariza e facilita esse processo”.
O secretário também fala do suposto
desvio de função: “Temos os agentes de saúde que trabalham junto às
famílias, que eles também tem essa finalidade [de fazer testagem]. Nós
temos algumas alternativas. Obviamente vamos usar todas”, pontua.
Projeto de Lei
Nesta semana, a discussão sobre a
possibilidade de farmacêuticos aplicarem testes rápidos para o Covid-19
alcançou o Parlamento. Um projeto de lei (PL 1976/20) apresentado pela
deputada Adriana Ventura (Novo-SP), e que tramita em regime de urgência,
quer acabar com a dúvida sobre a legalidade da decisão da Anvisa. O
texto propõe autorizar as farmácias de fazerem o procedimento,
independente de indicação média, durante todo o período de calamidade
pública.
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